segunda-feira, 18 de maio de 2020

ORTOGRAFIA:

CAPRICHOS DA LÍNGUA: EMBAIXO, MUÇARELA, GRAVIDEZ

O leitor Sylvio F. Bertoli sugere um assunto: a diferença de embaixo e em baixo. Aproveitaremos para ver também a locução adverbial em cima.

Há um par de advérbios que chama a atenção pela incoerência da grafia: embaixo e em cima, um junto e um separado. Mas é melhor observar a lista completa:

1) abaixo (rio abaixo)              2) acima (rio acima)
    debaixo do tapete                    de cima do banco
    embaixo da mesa                   em cima do balcão
    por baixo dos panos              por cima dos fatos

O #BCCCCV esclarece:


No caso 1, escreve-se três vezes junto e uma vez separado, até pelo fato de que a preposição por tem mais evidência que as outras (“porbaixo” ficaria deveras estranho!); no caso 2, três vezes separado e uma vez junto! Fazer o quê? É imposição oficial. Mas há um caso em que se escreve “baixo” separado da preposição ou de: é na relação entre de ... a,   formando locução adverbial, como nos seguintes exemplos:

A parede rachou de alto a baixo.

Pintou a escada de baixo a cima.

Já para usar a sequência em baixo, ou apenas a palavra baixo, é preciso que ela esteja modificando um substantivo – aí, baixo tem a função de adjetivo, sendo portanto variável:

Vive em baixo astral.

Trafega em baixa velocidade.

Falou em tom baixo.

QUEIJO MOZZARELLA

--- Há 15 anos trabalhando como revisor, principalmente em agências de publicidade, quando ocorre num trabalho de um cliente querer grafar “mussarela” como o nome daquele queijo muito utilizado em pizzas, tenho conseguido convencê-los a aceitar a forma mozarela, que consta no Michaelis (ao lado de muçarela, infelizmente) como aportuguesamento do italiano mozzarella. Isso apesar da turma do “mas eu sempre vi escrito assim”. Qual a sua opinião a respeito? Celso Mattos, Mogi das Cruzes/SP

Entendo que se deve adotar o termo italiano original – mozzarella – ou uma das duas formas dicionarizadas (Michaelis, Aurélio, Houaiss, PVOLP): mozarela, aportuguesamento da grafia italiana, ou muçarela, grafia baseada na pronúncia brasileira, mas que ainda parece estranha, por ser pouco usada. Trocar o cê cedilha por dois esses (mussarela)? Até ficaria simpático, mas deixaria muito confuso quem recorresse ao dicionário em caso de dúvida, pois não encontraria ali essa grafia. Na verdade é uma questão de hábito. Já nos acostumamos, por exemplo, com o cê cedilha em palavras como maça (arma de ferro), maçaneta, maçante, maçarico, maçom, miçanga, moçárabe, moçoró, muçulmano, muçum.

GRAVIDEZ TEM PLURAL?

A primeira vez que me perguntaram se a palavra gravidez tinha plural eu disse que não, até porque dois médicos a quem dirigi a mesma pergunta responderam que não há, e eu mesma não encontrei o plural nos dicionários e nos livros de medicina de que disponho. Além do mais, “gravidezes” soa estranho, o que justifica o seu desuso ou raridade, embora em artigos na internet seja bem frequente. A explicação para tal flexão é que as palavras terminadas em Z ou EZ formam o plural com o acréscimo de “es”, caso de avestruz – avestruzes, vez – vezes. Mas devo contrapor que nem sempre é assim: o plural de tez (cútis) é tez, não *tezes, e tampouco o adjetivo indez se usa no plural: os ovos indez. Por que então gravidez teria obrigatoriamente um plural?

Sendo assim, no caso de mais de uma, é melhor e mais elegante falar em gestação:

Maria teve sete gestações em 10 anos.

Ainda é possível reestruturar a frase:

Maria teve gravidez tubária duas vezes.

Ela teve gravidez de risco nos quatro filhos. [em vez de quatro gravidezes]

Maria Tereza de Queiroz Piacentini 

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