sábado, 17 de fevereiro de 2018

REGÊNCIA VERBO VISAR e PENALIZAR:

Solicitou-me uma aluna de Direito da UFSC que discorresse sobre a regência do verbo visar, uma vez que ela tinha escrito “tal medida visa o bem comum” e seu professor, num excesso de zelo, corrigiu a frase para “visa ao bem comum”.

Com efeito, professores mais conservadores ensinam que “visar”, como verbo transitivo direto, tem o sentido apenas de dirigir a pontaria ou pôr o visto em: Visou o alvo, está visando a refém; visaram o cheque, visou o passaporte. Já com o sentido de ter em vista, pretender, objetivar, deve-se usar o mesmo verbo com a preposição A. Neste caso, visar torna-se transitivo indireto: O regulamento do condomínio visa à comodidade de todos e ao bem-estar coletivo. Visamos a garantir sua segurança.
O #BCCCV esclarece:


Mas existe o dinamismo do idioma a ser considerado. “A regência, como tudo na língua, a pronúncia, a acentuação, a significação, etc., não é imutável. Cada época tem sua regência, de acordo com o sentimento do povo, o qual varia, conforme as condições novas da vida. Não podemos seguir hoje exatamente a mesma regência que seguiam os clássicos; em muitos casos teremos mudado” (Antenor Nascentes, 1960, apud Celso P. Luft, Dicionário Prático de Regência Verbal, 1987:534).

Esse é o caso do verbo visar, que vem perdendo a preposição, sobretudo antes de um infinitivo, como nestes exemplos:

Sua missão visava encontrar resposta para o imponderável.

Foram implementadas medidas políticas que visavam regular a sociedade, produzindo sujeitos disciplinados, produtivos, hierarquizados.

O princípio da razoabilidade visa, ademais, impor valores.

Mesmo diante de substantivo, a forma direta tem tido a preferência:

As artes visam a expressão do belo e o despontar da sensibilidade.

A divulgação deve ser impessoal, visando unicamente o interesse público.

Essa regência já está abonada por bons dicionários e bons autores, como Domingos Paschoal Cegalla: “Entretanto, nessa última acepção [de ter em vista, objetivar] não é sintaxe condenável dar ao verbo visar objeto direto” (Minigramática da Língua Portuguesa, 1996), e Celso Cunha/ Lindley Cintra: “Esta última construção [com objeto direto], condenada por alguns gramáticos, é a dominante na linguagem coloquial e tende a dominar também na língua literária, principalmente quando o complemento vem expresso por uma oração reduzida de infinitivoO ataque visava cortar a retaguarda da linha de frente” (Nova Gramática do Português Contemporâneo, 1985).

Devo esclarecer que este último exemplo é de Euclides da Cunha. Quem não costuma usar a preposição, portanto, está bem acompanhado!

PENALIZAR
Depois da discussão sobre deletar e protocolar, questionou-se a utilização de "penalizar". Devo dizer que é lícito, sim, empregar este verbo no sentido de “apenar, punir, infligir pena a”, conforme registram alguns dicionários. Como verbo transitivo direto que é, também pode ser usado na voz passiva. Exemplos:

Pelo art. 304 do CBDF, será penalizado com multa de 40 a 200 ORTNs o clube que incluir em sua equipe atleta sem condição de saúde para a partida.

A ré interpôs recurso de apelação, alegando que não pode ser penalizada por erro a que não deu causa.

Os meios de comunicação de massa atacam a benevolência da justiça e a falta de severidade das penas, fazendo ressurgir as teorias que penalizam infratores cada vez mais jovens e reacendem o debate sobre as vantagens dos castigos extremos.

Maria Tereza de Queiroz Piacentini

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

MAIÚSCULAS e MINÚSCULAS: Rapidinha

ESTADO COM MAIÚSCULA

Sobre o emprego da inicial maiúscula na palavra Estado persistem dúvidas, porquanto o Formulário Ortográfico de 1943 é omisso no tocante a território da Federação. Orienta ele, no item 49, 5°, que se empregue a letra inicial maiúscula “nos nomes que designam altos conceitos religiosos, políticos ou nacionalistas: Igreja (Católica, Apostólica, Romana), Nação, Estado, Pátria, Raça, etc.”, observando que “esses nomes se escrevem com inicial minúscula quando são empregados em sentido geral ou indeterminado”.

O #BCCCV esclarece:


Ocorre que estado, com minúscula, também é substantivo que significa uma situação, condição, e há casos em que só a inicial maiúscula pode precisar o sentido da frase:


Vive num estado deplorável.  [também poderia ser “Vive num Estado deplorável”]

A ação de reparação de dano promovida por Almeida contra Seguros será julgada no estado em que se encontra.  [na condição ou no Estado da Federação?]

Um traçado encefalográfico reto é hoje, em muitos estados, a definição legal de morte. [em muitas situações ou em muitos Estados americanos?]


Normalmente não existirá ambiguidade, mas para que o redator não se dê ao trabalho de ver caso por caso, é mais cômodo usar maiúsculas não só quando se trata de “poder juridicamente organizado” mas também sempre que se referir a uma unidade da Federação:


O governador visitou o Estado todo. 

Muitos migrantes foram mandados de volta ao seu Estado

Mora no Estado do Paraná.


Neste último caso (quando aparece o nome Paraná, Sergipe, São Paulo etc.), usa as maiúsculas quem considera a palavra Estado como parte do nome próprio. Quanto ao plural, nunca será erro escrever "Estados", porém é mais comum o uso das minúsculas, entendendo-se que aí há o emprego "em sentido geral":


Visitou todos os estados e municípios para colher dados.

A doença foi erradicada nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.


Maria Tereza de Queiroz Piacentin