terça-feira, 9 de julho de 2019

O ESPELHO: DE MACHADO DE ASSIS

O DUELO DE IDENTIDADES:
O conto “O espelho” foi publicado em 1882 no Jornal Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro e, logo após, veiculado à obra Papéis Avulsos. Ali, Machado de Assis demonstra todo o seu repertório que o qualifica como o grande escritor brasileiro de todos os tempos.

Dentre os vários escritos na obra concentrados, merece atenção especial aquele que trata das diversas maneiras de vislumbrar a personalidade humana e, até mesmo, a definição da identidade a partir de múltiplas perspectivas.
O espelho
Entre infinitas probabilidades o ser humano se define e se compreende a partir de um singular ponto de entendimento, através do qual consegue engendrar sua personalidade. Essas prospectivas asseveram o homem em seu pedestal de segurança, confirmando sua individualidade.
Entretanto, ao caminhar com seus iguais (fato que notoriamente o torna o ser inteligente e pensante, pois é a partir da interação com o outro que o homem se compreende racional – VIGOTSKY), o indivíduo sente o repulsar de suas pulsões elegendo o seu lugar no território ao qual se condiciona.
Todavia, as situações que definem a personalidade, tanto internas quanto externas, podem sofrer determinadas ingerências por parte das circunstâncias mais relevantes da vida do sujeito.
Esses incidentes determinam como alguma pessoa encara uma situação singular e marcante, e de que forma essa ocasião poderá moldar a sua personalidade e sua identidade para sempre.
Há na obra de Machado de Assis uma dilapidação da identidade concreta do personagem principal, que se enfoca como bom entendedor da interposição de uma e de outra identidade: a metafísica e a real.
Quando se encontra em situação inaudita, refuta-se sua individualidade habitual em troca de segurança.
Essa proteção é sua salvaguarda perante as intempéries que determinada situação, não corriqueira, lhe causa em seu mais incorporado receio ou medo.
No conto, a necessidade de ter com o outro, que não havia há muito tempo, pois sozinho estava por demasiado, causa-lhe a pulsão do outro. Esse impossível ter com o outro assombra, pois o ser humano é aquele que depende de sua socialização uma vez que, sem ela, é incompleto; sem identidade.
Assim, em situações difíceis, é possível o choque de duas identidades: a habitual vai-se com a dificuldade e aquela que perdura é a da segurança: a forma com a qual se espera que os outros vejam e reconheçam e que, de fato, interpretem.
O personagem, perdido em uma dessas situações, veste sua roupa de alferes, e ali, dessa forma, se sente seguro; como jamais havia se sentido antes.
A maneira qual as outras pessoas enxergam o indivíduo é para ele mais importante do que sua forma habitual de ser, criando assim duas identidades.
Uma dessas o leva a crer em sua força, que rechaça o medo, inclusive o pavor da solidão. A outra é aquela que sempre está presente, apenas deixada de lado em momentos apreensivos. Segundo ele, a identidade real é suplantada pela metafísica, nesses casos.
O que se nota no conto é a influência que outras pessoas possuem, de uma forma ou outra, sobre o indivíduo.
Ele é moldado e configurado a partir do outro. Este precisa ser visto e interpretado por aquele; precisa, acima de tudo, ser aceito.
Para isso, a troca de experiências num interacionismo irá afeiçoar os gostos, os sabores e dissabores de toda uma vida, inclusive da existência em sociedade; em um aprendizado que envolve não apenas aptidões, mas sim, antagonismos diversos.
E são nas incompatibilidades que afloram para mais ou menos, que se afirma as identidades manifestadas no conto de Machado de Assis.
vida social como um todo, em uma fatia de convivência necessita da aprovação do outro. Para muitos, a falta dessa afirmação perante o próximo pode aflorar a identidade de segurança, ou a maneira que se espera que o outro o veja. Em muitas situações, essas inadequações podem causar um duelo de personalidades, como afirma FREUD, e vencerá aquela capaz de confortar/confirmar uma autoafirmação.
Para o personagem do conto O espelho, sua determinação vinha por conta de um uniforme de alferes, que é como gosta que os outros o vejam.
De toda forma, independentemente da identidade que se confirma, o outro é sempre o caminho, a meta e a necessidade.
Iverson Kech Ferreira

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