sábado, 30 de janeiro de 2016

VERBOS DEFECTIVOS [para concursos]

 -1ª PARTE: COMPUTO, ME ADÉQUO, EXPLUDO

-- Há algum tempo tenho inquietações para com o verbo adequar. No Aurélio Eletrônico, a conjugação do presente do indicativo (1ª, 2a, 3a e 6ª pessoas) inexiste. Nele, também não há conjugação do presente do subjuntivo. Já no Houaiss, as conjugações acima consignadas são feitas. Diante dessa dissonância, gostaria de saber se a conjugação do Houaiss é aceita pela forma culta da língua portuguesa. Em caso positivo, por que o Aurélio não passou a registrá-la em suas recentes atualizações? Qual é, afinal, a referência mais conveniente a ser usada, já que se trata de duas sumidades no assunto?  B., São Paulo/SP


 --- Estou estudando para concursos públicos e deparei-me com uma dúvida. Diz respeito ao verbo computar. Seria (ainda) este verbo defectivo? Adriana Coelho, Rio de Janeiro/RJ
 
--- Como se conjuga a primeira pessoa do verbo colorir? Me disseram que é eu “coluro”, mas achei esquisito demais. Valéria, Frutal/MG
 
Verbo defectivo é aquele que tem “defeitos”, falhas na conjugação. Ou seja, sua conjugação não é completa. Isso acontece principalmente na primeira pessoa do presente – ninguém diz, por exemplo, ‘eu falo’ e ‘paro’ referindo-se aos verbos falir e parir. Ou: eu não *fedo (feder), eu *abulo ou *abolo (abolir). Nem se diz *coluro ou *coloro, mas se usa o gerúndio ou um circunlóquio: não estou fedendo, estou colorindo, dou/faço um colorido... São formas inexistentes mesmo, e vamos seguindo sem elas. Entretanto, algumas dessas lacunas se devem a uma questão mais propriamente estética do que técnica. É o caso de adequar, computar e explodir.
 
ADEQUAR é cada vez mais usado nas pessoas do singular e na terceira do plural do presente do indicativo e mesmo no subjuntivo, inclusive por falantes cultos, que contam com o aval do dicionário Houaiss. Se temos obliquo, abliqua, obliquam, por que não adequo, adequa, adequam
 
Noto que obliquar é citado no Acordo Ortográfico (2009), junto com apropinquar, averiguar, delinquir e afins, como verbos que oferecem dois paradigmas e por isso podem ter as formas rizotônicas “acentuadas no u mas sem marca gráfica” (p. ex. averiguo, enxaguas, delinquem)  ou “acentuadas fônica e graficamente nas vogais a ou i radicais” (a exemplo de averíguo, oblíquas, enxágua, delínquem).
 
Então, analogamente, quando se encontram as formas sem acentuação nessas pessoas consideradas defectivas, deve-se ler adeqUa, adeqUo, adeqUa, adeqUam, adeqUe, com a tonicidade na vogal u, que antes do Acordo levava acento agudo. Em Portugal, conforme assinalado no dic. Houaiss, a ocorrência dessa pronúncia é maior. No Brasil preferem-se as formas paroxítonas em ditongo decrescente, com a tonicidade na letra e, que então devem ser acentuadas graficamente: adéquo, adéqua, adéquam, adéque, adéques, adéquem. Exemplos:
 
Infelizmente eu não me adéquo a estas circunstâncias.
 
Diz o instrutor que o menino, ainda que tenha boa vontade, não se adéqua a nada.
 
Pessoas flexíveis e maduras se adéquam facilmente às novas situações.
 
Em seu livro, a autora se preocupa em apresentar receitas que se adéquem ao dia a dia das pessoas que não têm tempo para cozinhar.
 
Esperamos que esse município se adéque à nova lei. 
 

 

Maria Tereza de Queiroz Piacentini

SÃO DEFECTIVOS ou NÃO SÃO?

COMPUTO, ME ADÉQUO, EXPLUDO:

Em vista de três consultas específicas, estávamos falando sobre os verbos defectivos ou defeituosos, aqueles que apresentam lacunas em algumas pessoas verbais. Nessa categoria se enquadram todos os verbos que exprimem fenômenos meteorológicos. Por exemplo, amanhecer, chover, anoitecer, garoar, gear, nevar, trovejar só se conjugam na terceira pessoa do singular de cada tempo e não possuem as formas imperativas. São chamados verbos impessoais.


Há outros que podem ser considerados defectivos, os pessoais, que se apresentam sobretudo na terceira pessoa do singular e do plural de cada tempo, como os que exprimem fenômenos da natureza vegetal (arborescer, frutificar, murchar, verdejar, vicejar etc.) e os verbos onomatopaicos ou imitativos de vozes animais e de ruído das coisas (balir, cacarejar, ganir, grasnar, latir, mugir, badalar, chiar, espoucar/espocar, tilintar/tlintar etc.). 
 
Tanto os verbos que exprimem estados atmosféricos ou vegetativos quanto os onomatopaicos admitem conjugação completa, pois eles podem ser empregados em sentido figurado (eu trovejei de raiva, amanheço pensando em ti, nós frutificamos, eles uivaram de dor) e também em outras acepções, como “eles badalam em todas as festas;  o filme foi muito badalado”.
 
Alguns, entretanto, continuam defectivos, já que não têm a primeira pessoa do presente do indicativo, tais como os verbos falir, parir, balir, latir, colorir, que por conseguinte não têm o presente do subjuntivo.
 
EXPLODIR não é verbo defectivo em si. Ele é conjugado conforme o verbo dormir, segundo dicionários especializados; portanto, pode-se dizer “ele explode, eu expludo; ele que expluda o balão”. O dicionário Houaiss registra as conjugações brasileiras explodo, exploda, observando que também existem expludo e expluda. Já vi expludo em livros editados em Portugal, numa boa. Aqui, depois que o ex-presidente Figueiredo falou (corretamente) “eu expludo”, criou-se o estigma e a má reputação do verbo, como se ele devesse ter explodido de outra forma: "Ele que se exploda!"
 
COMPUTAR não é tampouco verbo defectivo. Existem e são usadas formas como “eu computo, ele computa os dados diariamente; computa isso para mim?” Não falar “computa” seria talvez uma opção pessoal por causa da sonoridade indigesta para alguns. O dicionário Aurélio não traz o presente “computo, computas, computa”, como faz o Houaiss, que registra todas as formas. Mas devemos lembrar que as palavras existem não porque os dicionários querem que elas existam. É o contrário: os dicionários devem espelhar o vocabulário existente. 
 
De qualquer modo, um alerta: quem está se submetendo a um concurso público deve evitá-las, pois nunca se sabe o grau de tolerância da comissão que vai corrigir as provas, a qual pode aceitar ou rejeitar o Houaiss, dicionário que se propôs a registrar um uso efetivo, encontrado mesmo entre falantes cultos, assim considerados, na ciência linguística, os brasileiros da zona urbana que têm curso superior completo. Aliás, formas em discussão jamais deveriam ser objeto de provas de língua portuguesa.

Maria Tereza de Queiroz Piacentini 

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

ACORDO ORTOGRÁFICO:

Entra em vigor!

Depois de um período de seis anos de transição, o acordo ortográfico assinado com oito países de Língua Portuguesa entrou oficialmente em vigor no Brasil. 
As mudanças do novo acordo ortográfico começaram em 2008, mas só agora, em janeiro de 2016, se tornaram obrigatórias em terras brasileiras. 

O BCCCV informa:

O Brasil é o terceiro dos oito países que assinaram o tratado a tornar obrigatórias as mudanças, que já estão em vigor em Portugal e Cabo Verde. Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste ainda não aplicam oficialmente as novas regras ortográficas.
Com as mudanças, algumas palavras perderam o acento, outras se separaram ou se uniram.O alfabeto também ficou maior.
Agora, além do K, temos também o Y e o W, devido à formação das de origem indígena. Ao todo, menos de um por cento das palavras no Brasil mudarão, mas são muitas novas regras, e é bom que fiquemos atentos: documentos oficiais, provas, para eles, agora, só vale o novo acordo.
Abaixo separamos as principais mudanças:
O trema – dois pontos sobre a vogal u – foi eliminado, e pode ser usado, apenas, em nomes próprios. No entanto, a mudança vale apenas para a escrita, e palavras como linguiça, cinquenta e tranquilo continuam com a mesma pronúncia.
Os acentos diferenciais também deixaram de existir, de acordo com as novas regras, eliminando a diferença gráfica entre pára (do verbo parar) e para (preposição), por exemplo. Há exceções como as palavras pôr (verbo) e por (preposição) e pode (presente do indicativo do verbo poder) e pôde (pretérito do indicativo do verbo poder), que tiveram os acentos diferenciais mantidos.
O acento circunflexo foi retirado de palavras terminadas em “êem”, como nas formas verbais leem, creem, veem e em substantivos como enjoo e voo.
o acento agudo foi eliminado nos ditongos abertos “ei” e “oi” (antes “éi” e “ói”), dando nova grafia a palavras como colmeia e jiboia.
O hífen deixou de ser usado em dois casos: quando a segunda parte da palavra começar com s ou r (contra-regra passou a ser contrarregra), com exceção de quando o prefixo terminar em r (super-resistente), e quando a primeira parte da palavra termina com vogal e a segunda parte começa com vogal (auto-estrada passou a ser autoestrada).
E para você não escrever errado, existem aplicativos que podem te ajudar na hora da dúvida.
A grafia correta das palavras conforme as regras do acordo podem ser consultadas no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp), disponível no site da Academia Brasileira de Letras (ABL) e por meio de aplicativo para smartphones e tablets, que pode ser baixado em dispositivos Android, pelo Google Play, e em dispositivos da Apple, pela App Store.

RAPIDINHA DE PORTUGUÊS:

ABREVIATURAS DE MESES:


O BCCCV informa:

As abreviaturas dos meses são feitas com três letras (maio, por ter apenas 4 letras, não precisa ser abreviado) e pode-se usar o ponto abreviativo ou não:

janeiro – jan. ou jan
fevereiro – fev. ou fev
março – mar. ou mar
abril – abr. ou abr
maio – mai. ou mai (ou maio mesmo)
junho – jun. ou jun
julho – jul. ou jul
agosto – ago. ou ago
setembro – set. ou set
outubro – out. ou out
novembro – nov. ou nov
dezembro – dez. ou dez



--- Quando vamos nos referir à periodicidade de dois meses dizemos bimestral, e quando se tratar de 5 meses, qual a forma correta a ser utilizada? Vânia Lucia Fernandes Farias, São Paulo/SP

Periodicidade ou duração de três meses = trimestral; quatro meses = quadrimestral; cinco meses = quinquimestral, seis meses = semestral

MAIS-QUE-PERFEITO:

--- Gostaria de saber o que é feito, em nossa língua, como é falada atualmente, com o tempo verbal mais-que-perfeito. Ex. É o que Plotino percebera, ao ver no “Deus é amor” um amor que “irradia em si e para si” (Julia Kristeva, História de amor) em que o revisor de textos “corrigiu” percebera e colocou percebeu. G. Ribeiro, Itatiba/SP

O BCCCV informa:


De fato, tem-se a impressão de que ninguém mais o emprega. Refiro-me apenas ao pretérito mais-que-perfeito simples [fora, amara, vendera, saíra], restrito quase que apenas ao âmbito literário, pois o mais-que-perfeito composto continua a ser usado cotidianamente: tinha sido, tinha amado, havia vendido, havia saído são as formas verbais comuns na linguagem falada. 
A rigor, o mais-que-perfeito não deve se confundir com o pretérito perfeito simples: este exprime uma ação ou processo que se completou no passado; aquele, uma ação que ocorreu antes de outra já passada. Sendo assim, a construção no mais-que-perfeito está sempre ligada a uma oração no pretérito – geralmente no mesmo período. Mas algumas vezes, dependendo do estilo de quem escreve, o pretérito perfeito vem na sentença anterior. Nos exemplos abaixo se pode perceber a íntima relação dos dois tempos verbais:
Um sueco devolveu as moedas que roubara em Vaexjoe, no sul do país, em 1972, informou o jornal local. 
A viagem se tornara tão monótona que a maioria resolveu desembarcar no primeiro porto.
Quando chegamos, a festa já havia começado.
Daniel, 25 anos, acidentou-se gravemente. Meses antes, ele tinha recebido um rim doado pela própria mãe.
Então, uma frase isolada admite os dois tempos verbais: É o que Plotino percebeu/ percebera, ao ver no “Deus é amor” um amor que “irradia em si e para si”. O problema com o revisor de texto é que, não sendo analítico, ele não consegue perceber uma diferença que só o contexto poderia explicitar. Sem a indicação do que foi dito antes, é o pretérito perfeito que será visto como correto.

Maria Tereza de Queiroz Piacentini

QUEM: rapidinha de Português

--- A professora podia dizer quando é que de fato se usa o pronome quem? Para se referir a uma pessoa também posso usar que? A. Silva, São José/SC


 
Emprega-se o pronome relativo quem com referência a pessoa ou coisa personificada:
 
Podemos ver as declarações da Microsoft, para quem essa operação mostra como o panorama da concorrência pode mudar rapidamente.
 
Ganhou de presente um gato persa, a quem tratava regiamente.
 
A mim quem converteu foi o sofrimento. (Coelho Neto)
 
Quem lançou as bases do Direito das Gentes foi Vitória.
 
Só quem sabe amar pode ser feliz.
 
Nos três últimos exemplos (nos quais não há um antecedente), o pronome quem é denominado relativo indefinido

 
Para iniciar orações adjetivas restritivas e explicativas, somente o pronome que é usado:
 
João, que mora em Goiás, passou as férias numa praia catarinense.
 
Ofereceu um jantar ao ministro que acabara de ser nomeado.


 
Entretanto, quando a preposição se faz necessária, emprega-se quem:
 
Ofereceu um jantar ao ministro a quem acabara de nomear.
 
Gosto das pessoas com quem trabalho.
 
Olha, chegaram Milena e Juli, de quem falávamos há pouco.
 
O governador fez bela homenagem a Marcílio, a quem sempre admirou.

Maria Tereza de Queiroz Piacentini

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

LINGUAGEM JURÍDICA: PERTINE, RECURSAL, MENOR DE IDADE

-- Muito comum é encontrar nas maçudas obras de doutrina jurídica a expressão: "no que pertine", significando no que se refere, no que se relaciona. Busquei-lhe a origem etimológica em diversos dicionários, com exceção do Houaiss, e foi debalde o meu esforço. Pode me ajudar abonando ou não a expressão? Eduardo José Pereira Matos, Fortaleza/CE

Seria fácil abonar a expressão se houvesse na língua portuguesa o verbo “pertinir”, porque “pertine” seria a 3ª pessoa do singular do presente do indicativo desse verbo, assim como pertence e refere o são de pertencer referir. Se não temos e não usamos “pertinir”, de onde teria surgido essa forma verbal? Do latim “pertinere”, que nos trouxe o verbo pertencer e os derivadospertinência e pertinente. Como pertinente tem o significado de concernente, que se equipara à locução no que concerne a, por analogia se criou “no que pertine a”. Esta, contudo, é errônea. E não faz falta, pois há um bom número de locuções prepositivas adequadas à mesma situação, além de no que concerne a: quanto a, no que se refere a, no que diz respeito a, em relação a, relativamente a, entre outras. 
 
--- Existe a palavra recursal? Em pareceres jurídicos da minha empresa essa palavra é muito comum, porém procurei no Aurélio, no Michaelis, no Dicionário Prático do Celso Luft, no dicionário Jurídico da editora Forense e não tem esse termo. M. L. O., Rio de Janeiro/RJ
 
O adjetivo recursal é registrado no Dicionário de Usos do Português do Brasil (2002), com os seguintes significados: de recurso, como em “prodigalidade recursal”; que orienta a interposição de recurso; que recebe recurso, como em “instâncias recursais”. E constava no dicionário Houaiss de 2001: “relativo a recurso”, com a observação de que surgiu no Brasil em meados dos anos 80. Surpreendentemente, as novas edições do Aurélio e do Houaiss não trazem esse termo, embora ele esteja oficializado no VOLP - Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa 2009. 
 
--- É correto dizer que uma pessoa é de menor, significando que tem menos de 18 anos? L. A., Foz do Iguaçu/PR
 
Juridicamente, não. A fórmula correta é menor de idade. Argumenta-se que de menor é modo abreviado de expressão "é de menor idade", mas aí se trata de uso coloquial, não aceito na área jurídica. O que se pode dizer, como alternativa, é: "fulano é menor" (sem a preposição de, note-se), que seria uma redução de “[fulano é] menor de idade”.
 
--- Como deve ser o correto: recebi estes autos do... e faço conclusos ao... ou faço-os conclusos ao – faço-os, está correto? J. B. S. F., Londrina/PR
 
O uso do pronome átono o está correto, pois tal construção gramatical (norma culta) requer o objeto [direto] do verbo fazer. É como se fosse eles (os autos) na linguagem popular: recebi os autos e faço [eles] conclusos. Portanto: Recebi estes autos efaço-os conclusos... 

Maria Tereza de Queiroz Piacentini